A DIFÍCIL MISSÃO DE SELECÃO QUANDO O ESPAÇO FÍSICO NÃO
SUPORTA O CRESCIMENTO DO ACERVO: a experiência do Serviço de
Biblioteca e Documentação da FEA/USP
Margarida Maria de Sousa¹
1Bibliotecária, Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade da USP, São Paulo, SP
Mestre em Ciência da Informação – Escola de Comunicações e Artes da USP
Resumo
Referência brasileira nas áreas de Administração, Economia, Contabilidade e
Atuária, o Serviço de Biblioteca e Documentação da Faculdade de Economia,
Administração e Contabilidade da Universidade de São Paulo vive um momento
crítico com relação ao seu espaço físico de 1500 m² que abriga atualmente
165.000 volumes. Com um crescimento constante, busca-se melhorar e otimizar a
qualidade da atividades de seleção, através de alguns critérios estabelecidos em
sua política de desenvolvimento de coleções.
Palavras-chave: Bibliotecas universitárias; Desenvolvimento de coleções.
Abstract
Brazilian reference in the areas of Business Administration, Economics, Accounting
and Actuarial Science, the Library Service and Documentation, Faculty of
Economics, Business, Administration and Accounting of the University of São Paulo
is in a critical moment with respect of the physical space of 1500 m² which currently
houses 165,000 volumes. With steady growth, we seek to improve and optimize of

selection activities, through some established criteria in its policy for collection
development.
Keywords: Academic libraries; Library collections development.
1 Introdução
O Serviço de Biblioteca e Documentação da Faculdade de Economia da
Universidade de São Paulo (SBD/FEA/USP) começou a ser constituído em 1942, com o
acervo do DSP – Departamento do Serviço Público do Estado de São Paulo; mais tarde
esse acervo juntou-se ao acervo do Instituto de Administração, até que em 1965 veio
constituir o atual Serviço de Biblioteca da FEA/USP.
Com uma área física de 1500 m², o SBD/FEA abriga atualmente 165.000 volumes;
a média de crescimento no acervo gira em torno de 3.000 volumes/ano. É referência no
Brasil nas áreas de Administração, Economia, Contabilidade e Atuária e vive um dos
momentos mais críticos de sua história com relação ao gerenciamento do espaço físico
para acomodação de seu acervo. Aguarda-se para breve uma reforma que expandirá sua
área para 5.000 m². Enquanto a reforma não acontece, vamos tentando nos adaptar a
situação que se apresenta no momento.
O espaço insuficiente para abrigar a coleção não é peculiar à nossa Biblioteca,
sabe-se que muitas instituições no Brasil vivem a mesma dificuldade. Apesar de muitos
documentos já estarem disponíveis em suporte eletrônico, nós, profissionais
bibliotecários, ainda lidamos com grande demanda de livros, periódicos e teses no
suporte de papel. Essa demanda por livros impressos se dá principalmente na
graduação, onde o número de alunos é grande, e a maioria dos professores trabalha com
uma bibliografia básica comum a diversos cursos; o que nos obriga a manter uma

quantidade razoável de exemplares dos mesmos títulos; além do que, frequentemente
são publicadas novas edições, que rapidamente vão transformando em obsoletas as
anteriores.
A fim de tentar minimizar a dificuldade proveniente dessa falta de espaço para
abrigar novos volumes, o SBD/FEA procura investir melhor na seleção de material
bibliográfico a ser incorporado, de modo a não colocar no acervo bibliografia
desnecessária e com poucas possibilidades de uso.
É importante lembrar que contamos com cooperação e parcerias de outras
instituições através do empréstimo entre bibliotecas, principalmente para a obtenção de
livros, e da comutação bibliográfica que supre as nossas deficiências quanto aos artigos
de periódicos e teses de outras instituições tanto no Brasil quanto no âmbito internacional.
Temos como exemplos: as universidades estaduais paulistas, a Fundação Getúlio Vargas,
todas as instituições ligadas ao Catálogo Coletivo Nacional - CCN através do Instituto
Brasileiro de Informação em Ciência e Tecnologia - IBICT, a British Library e a Assembléia
do Conselho Latino Americano de Escolas de Administração - CLADEA entre outros.
2 Revisão de Literatura
As bibliotecas universitárias fornecem apoio e suporte às atividades de ensino,
pesquisa e extensão nas universidades, sem dúvida, são um ponto nevrálgico. Apesar de
subordinadas a Instituições de Ensino Superior, são organizações que precisam gerenciar
recursos humanos, tecnológicos e financeiros. Mas a mais importante de suas
responsabilidades é disponibilizar adequadamente os seus recursos informacionais.
De acordo com Leitão (2005, p. 27)
[...] a relação entre biblioteca universitária e instituição à qual pertence é
complexa e envolve inúmeros aspectos, dos quais podemos destacar: o
armazenamento dos documentos que apóiam, historiam e estimulam o
saber [...].

Em 2000, Murilo Cunha fez uma projeção sobre o futuro da biblioteca universitária
brasileira em 2010.
Na universidade, a preservação do conhecimento é uma das funções que
menos rapidamente mudam. O computador - ou mais precisamente, a
convergência digital dos vários meios de comunicação (impresso, vídeo
e sonoro) e das experiências sensoriais por meio da realidade virtual - já foi
além da imprensa e de seus impactos no conhecimento. Através dos
séculos, o ponto focal da universidade tem sido a biblioteca, com o seu
acervo de obras impressas preservando o conhecimento da civilização.
Atualmente, esse conhecimento existe sob muitas formas: texto, gráfico,
som, algoritmo e simulação da realidade virtual e, ao mesmo, ele existe
literalmente no éter, isto é, distribuído em redes mundiais, em
representações digitais, acessíveis a qualquer indivíduo e, com certeza, não
mais uma prerrogativa de poucos privilegiados da academia (CUNHA, 2000,
p. 73).
Nesse artigo, Cunha alerta para a disponibilização da informação em formato
virtual ou em rede e pontua as novas realidades advindas com a educação à distância, as
mídias interativase o acesso à tecnologia. Chegamos a 2010 e confirmam-se esses
prognósticos. Porém ainda permanece o acervo físico; em nosso cotidiano trabalhamos
com ambas as realidades, acervos impressos e digitais.
As bibliotecas universitárias estão divididas nas atividades de atendimento aos
usuários, processos técnicos e aquisição. Para que o processo de aquisição se concretize
com qualidade é preciso que seja feito um bom trabalho de seleção.
O processo de seleção de material bibliográfico é uma das etapas mais
importantes dentro do desenvolvimento de coleções. Envolve conhecimento da área de
atuação, estudos de uso, demanda e tomada de decisão baseados em políticas
previamente estabelecidas.
Não temos condições de prever o futuro, assim como podemos entender que
colegas que nos antecederam também incorporaram material ao acervo de acordo com o

espaço e as demandas que viviam em sua época de atuação.
A atividade de seleção muitas vezes requer bom senso; de acordo com a situação
atual da biblioteca, eventualmente as medidas a serem tomadas podem não parecer
ideais, mas são as necessárias e possíveis no momento.
Segundo Vergueiro (1993) a preocupação com uma seleção mais criteriosa dos
materiais bibliográficos teria surgido entre os anos 60 e 70, principalmente em grandes
bibliotecas universitárias.
Em artigo de 1978, Antonio Miranda fez uma reflexão sobre a biblioteca
universitária; passados mais de trinta anos seu conteúdo permanece atual. Abaixo uma
menção feita à tarefa de seleção:
Sem dúvida alguma, "Seleção é a atividade técnica que orienta a formação
e o desenvolvimento do acervo". Raríssimas bibliotecas universitárias
fazem avaliações periódicas de suas coleções no sentido de adequá-las,
em termos de pertinência e relevância, em graus de quantidade e
excelência, aos conteúdos programáticos dos cursos oferecidos pela
universidade, tomando-se em consideração o tipo, as características de
seus usuários. Como podem, então aplicar os recursos para uma aquisição
equitativa e racional? Deixando aos professores a tarefa da seleção, sem
orientação e sem uma política definida? Aqui reside o grande conflito, o
fator que mais compromete o envolvimento da biblioteca com a
comunidade, causador das queixas e frustrações mais desconcertantes
(MIRANDA, 1978).
Como a biblioteca pode ser sempre equitativa e racional? É fato que nem sempre
conseguiremos agradar a todos, mas é compromisso da biblioteca universitária fazer o
possível para seguir as ementas dos cursos oferecidos e o perfil de sua comunidade
acadêmica. Os recursos financeiros nem sempre são suficientes, tanto para a compra de
livros e assinaturas de periódicos quanto para a construção de uma estrutura física que
possa abrigar com conforto um acervo de excelência.

3 Materiais e Métodos
O universo da pesquisa é o Serviço de Biblioteca e Documentação da Faculdade
de Economia, Administração e Contabilidade da Universidade de São Paulo. Os métodos
empregados foram o de observação participante do trabalho cotidiano e coleta de dados
estatísticos sobre o acervo, uma vez que a autora atua diretamente no processo de
desenvolvimento do acervo, como responsável pela Seção de Aquisição. A experiência de
sete anos no Atendimento ao Usuário permitiu-nos adquirir certo feeling sobre o perfil dos
nossos usuários e de suas demandas; o diálogo e feedback com a Seção de Atendimento
aos Usuários é constante e eficiente.
Além do mais, atentamos para os lançamentos e novidades do mercado editorial
nas áreas de interesse através dos catálogos de livrarias e editoras e via internet.
Baseada nos enunciados de Thiollent (1998), buscamos partir para a investigação
baseada em situações concretas, privilegiando o lado empírico da pesquisa.
Nossos instrumentos de trabalho principais foram as estatísticas de uso e as
listagens de bibliografia básica e complementar informadas pelos docentes, sugestões
destes últimos, dos discentes e pesquisadores.
Ainda que de forma tímida, temos tentado avaliar a coleção atual, tanto de forma
qualitativa quanto quantitativa. Essas metodologias são melhor descritas abaixo:
Quantitatvas – baseadas em dados estatísticos, principalmente sobre
tamanho da coleção, assunto, idade, clientela, etc.; um exemplo deste
método seriam os dados estatísticos colhidos sobre os assuntos solicitados
pelos usuários e não atendidos pela biblioteca.
OBS.: os métodos quantitativos, apesar de fácil aplicação, não devem ser
tomados isoladamente pois nesse caso, deixam de considerar o fator
qualidade.
Qualitativas – preocupadas com o conteúdo do acervo. Podem ser
realizadas através do julgamento de especialistas, através da comparação

com bibliografias publicadas ou mesmo especialmente elaboradas para
esse fim, ou através do uso real da coleção (MACIEL; MENDONÇA, 2006,
p. 24).
4 Resultados Finais
O SBD/FEA tem procurado se adaptar à falta de espaço para acondicionar novos
volumes, adquiridos por compra e doação, através de uma série de medidas, sendo uma
delas referente à guarda dos livros; temos sido obrigados a ocupar todos os espaços
livres nas estantes, inclusive as prateleiras mais altas e as mais baixas que num passado
não muito distante ficavam vazias para facilitar a acessibilidade aos usuários, o que não
se recomenda fazer, mas partimos do princípio de tratar-se de situação emergencial e
temporária.
Outro trabalho que tem sido feito com bastante cuidado é a seleção das constantes
doações que chegam. Partimos do pressuposto de aceitar as doações a fim de
conseguirmos suprir possíveis falhas, explicando aos doadores que só manteremos no
acervo o que for relevante, e assumindo a responsabilidade de repassar o restante do
material a outras instituições.
Muitas das doações que nos chegam são provenientes de pessoas que desejam se
desfazer de acervos particulares por motivos os mais diversos: mudança de residência,
falecimento do proprietário das obras, desinteresse no material, entre outros. Arriscamos
estimar que apenas cerca de 10 a 20% dessas doações são tombadas e passam a
compor nosso acervo.
A prioridade para o repasse é para outras unidades da USP com acervos afins ao
nosso, em seguida, outras instituições de ensino, bibliotecas públicas e organizações não
governamentais; dessa forma acreditamos também exercermos nossa responsabilidade

social. Nada é jogado fora, a não ser que o material esteja infectado ou impossível até
mesmo de ser reciclado.
Só se incorpora realmente o que é pertinente, relevante para a FEA, que venha de
parcerias e convênios previamente acordados (ex.: IBGE, Word Bank) ou que tenha
demanda confirmada pelas estatísticas de empréstimo ou por indicações da comunidade.
Observa-se o bom estado, a pertinência às áreas de estudo, autoridade do autor,
valor histórico, teórico ou clássico de algumas obras, atualidade, idiomas mais acessíveis,
indicação de docentes e da comunidade local de pesquisadores. Obras disponibilizadas
integralmente na internet também não são incorporadas.
Na contramão da incorporação de novas obras procura-se avaliar a coleção
periodicamente, através do descarte de obras adquiridas por doação que estejam
desatualizadas e das quais já tenhamos edições mais recentes, material em estado físico
precário e doação a outras unidades da USP de materiais pertinentes a outras áreas de
estudo que tenham sido incorporados ao acervo em outras épocas de maior
disponibilidade de espaço físico.
O descarte de obras que foram adquiridas no passado através de processos de
compra exige um cuidado e um olhar mais apurado, tendo em vista seu valor patrimonial
e nossa responsabilidade com o gasto dos recursos públicos Nesse caso, busca-se
justificar muito bem o motivo do descarte para prestação de contas junto à Assistência
Financeira da Faculdade e posteriormente aos sistemas financeiros da Universidade e do
Estado de São Paulo.
5 Considerações Finais
Existe um grande avanço no que se refere ao acesso de periódicos eletrônicos e
teses da USP, mas no que se refere aos livros, ainda estamos muito longe da

disponibilização e acessibilidade em meio digital. Alguns e-books estão disponíveis à
nossa comunidade universitária, contudo ainda aquém da demanda dos estudantes,
porém essa é uma discussão que envolve a estrutura e o comportamento do mercado
editorial e a polêmica questão do acessar versus possuir.
Soma-se a esta questão, certa reserva na consulta online de livros, visto que são
textos mais extensos e a leitura na tela do computador caracteriza-se por ser mais rápida,
dinâmica e não linear; para alguns o livro impresso ainda traz leitura mais agradável,
menos cansativa aos olhos; para outros o computador ainda não está tão facilmente à
mão; enquanto existem outros tipos de suporte, como os artigos de periódicos por
exemplo que já são mais procurados e aceitos pelo público na forma eletrônica.
Não podemos cair na ilusão de que tudo que é digital será melhor e mais valioso,
desprezando as publicações impressas; tampouco pararmos no passado valorizando
apenas o tradicional impresso e repudiando a modernidade tecnológica na
disponibilização da informação. Para todos os tipos de publicações encontraremos o seu
público, sua usabilidade e o seu valor. Afinal o que importa é o conteúdo, a informação,
que transmitida através desses suportes, é potencial geradora de conhecimento.
Recordemos as Leis de Ranganathan descritas abaixo por Lancaster (1996, p. 11-
14):
1- Os livros são para usar (o dinheiro gasto com um livro pouco ou nunca usado,
significa menos dinheiro para compra de outro de forte demanda);
2- A cada leitor seu livro (entenda-se: a cada leitor sua necessidade, e
possibilidade de êxito na utilização deste título);
3- A cada livro seu leitor (verificar se a necessidade do usuário foi satisfeita,
divulgar as novidades);
4- Poupe o tempo do leitor (satisfazer as necessidades do público com a maior
eficiência possível);
5- A biblioteca é um organismo em crescimento (a biblioteca precisa estar sempre

pronta a adaptar-se a novas situações, incluindo as novas possibilidades
oferecidas pela tecnologia).
Estamos vivenciando um momento de transição, o tempo da biblioteca híbrida; é
fundamental a adaptação à nova realidade digital, contudo a biblioteca convencional com
o seu valioso patrimônio cultural em papel, ainda deverá permanecer por um longo
período. Estamos a caminho de um futuro promissor ao aprendermos a valorizar o
passado, e não esquecer que a informação gerada nesse período ainda se encontra em
sua maioria impressa no papel, para tanto, devemos estar atentos para acomodar,
preservar e disponibilizar o acesso a este patrimônio da melhor forma que pudermos.
6 Referências
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Universidade de São Paulo. São Paulo: FEA/USP, 1984.
CUNHA, Murilo Bastos da. Construindo o futuro: a biblioteca universitária brasileira em
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